4 de novembro de 2015
A indústria imobiliária tem registrado um forte aumento no número dos distratos, instrumento pelo qual compradores de imóveis novos desfazem o negócio, o que faz o imóvel retornar à construtora ou incorporadora. O distrato é prejudicial para ambas as partes. O cliente não realiza o sonho da casa própria e a empresa sofre um desequilíbrio na equação econômica do empreendimento. Outro aspecto torna a situação mais grave: além de ressarcir o comprador, a empresa precisará arcar com compromissos já assumidos para concluir a obra e suportar despesas para conseguir vender novamente a unidade, gerando mais desequilíbrio. A Lei de Incorporação (Lei 4.591/64) não dispõe sobre os efeitos dos distratos. Ela prevê que o contrato de compra e venda de uma unidade é irrevogável e irretratável. Os empreendimentos são desenvolvidos através de Sociedades de Propósito Específico e, recentemente, institui-se o Patrimônio de Afetação para segregar os valores de cada empreendimento, de modo a garantir a sua construção, protegendo o conjunto de compradores. A devolução de recursos pelos distratos fragiliza essas garantias. Não existindo equilíbrio, as ineficiências e os riscos serão fatalmente cobertos pelo universo dos demais compradores. Portanto é necessário definir um critério coerente com a dinâmica natural da incorporação imobiliária. Quando a empresa assume grande número de distratos e devolve aos compradores um expressivo volume de recursos, precisa adiar novos lançamentos até reduzir estoques. Por isso, os distratos, junto com a atual crise, têm contribuído para o desemprego na construção, além de colocar em risco a saúde financeira das empresas. As divergências sobre os valores a serem devolvidos levam à judicialização dos processos, sugando ainda mais tempo e recursos da sociedade, das empresas e dos clientes. A situação tem que ser vista com cautela, pois o cenário atual gera incertezas para ambos os lados. Se o comprador não consegue crédito ou pagar as parcelas, é natural que haja um acordo para a solução do problema. No entanto, há casos em que o comprador viu frustrada sua expectativa de valorização do imóvel adquirido na planta. O investimento em um imóvel não é comparável ao de títulos financeiros. Algo tão sério como uma aquisição imobiliária não pode ser tratado como uma simples opção de compra que desobriga o adquirente de receber o imóvel, caso o mesmo não lhe interesse mais. É preciso aperfeiçoar a legislação para instituir equilíbrio entre as partes na compra e venda do imóvel e impedir que a escalada dos distratos prejudique toda uma cadeia produtiva. A casa própria é o maior sonho das famílias brasileiras e a indústria imobiliária leva muito a sério a responsabilidade de concretizá-lo.
JOSÉ ROMEU FERRAZ NETO é presidente do SindusCon-SP;
RODRIGO LUNA
é presidente da Fiabci-Brasil;
RUBENS MENIN
é presidente da Abrainc *
Artigo publicado nos jornais O Estado de S. Paulo e Folha de S. Paulo.
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